quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Apresentação

Nasci no concelho de Mértola e lá vivi, no seio de uma família de agricultores até aos 20 anos de idade. Os meus progenitores trabalhavam como responsáveis de uma grande herdade (latifúndio), caracterizada pelas culturas de sequeiro em regime extensivo, tendo como culturas predominantes os cereais, com relevo para o trigo.
Os primeiros anos da minha vida, foram passados no ambiente rural em que as tradições ancestrais se mantinham, com um respeito quase sagrado pelos progenitores e com ausência quase total de delitos, sem necessidade de polícias nem de tribunais (ó campo, quando te voltarei a ver! “O rus, quando ego te aspiciam”; palavras de Horácio, saudoso dos prazeres da vida campestre.
Sem dúvida que o homem que nasceu e viveu sempre na cidade, não se apercebe da pureza e riqueza do mundo rural e, neste domínio, está em desvantagem.
Por imperativo das circunstâncias, deixei o "Alentejo Profundo" onde os contos eram narrados à volta da lareira; onde nas longas noites de serão se reunia a família, ou às rápidas horas de uma noite de estio, na soleira da porta, ao auditório atento, a ouvir histórias por pessoas que possuíam repertórios insgotáveis: de príncipes e mouras encantados, de bruxas, de lobos, de proezas de cavaleiros, de fadas benfazejas, etc. O conto das mouras encantadas, princesas formosíssimas que ficaram desses remotos tempos na península, em paços invisíveis, à espera de quem lhes viesse quebrar o cativeiro, soltando a palavra mágica (Ilustrando com um exemplo: ...uma vez uma moira linda aparecia sobre um penedo a fiar e cantava que era uma maravilha! Todos tinham medo de se aproximar. Um rapaz decidiu-se e pôs-se a cantar ao desafio com a moira; ela tranformou-se numa serpente... e.... Desfecho - O rapaz e a moira ficaram muito ricos, casaram e foram felizes para sempre!!!).
As tais moiras encantadas tinham quase sempre a ver, regra geral, com lugares onde existissem vestígios de eras remotas, onde supostamente tivessem sido encontrados tesouros... panelas cheias de moedas de ouro, etc. Contavam que, a esta ou àquela hora, principalmente à meia noite as mouras gritavam, choravam ou riam às gargalhadas batendo palmas.
Existia também em tudo isto, uma tendência natural para a superstição.
Recordo mentalmente, centenas de vezes, todos os passos destas histórias; tenho tudo gravado na memória.
Era-me familiar o canto matinal do galo, e o amanhecer já não tinha para mim quaisquer segredos. O Sol encontrava-me sempre de pé, e em pé me deixava ao esconder-se.
Onde é que as histórias começam verdadeiramente? Na vida, não abundam os começos bem definidos, os momentos em que se pode dizer que tudo começou quando os recordamos. Contudo, há ocasiões em que o destino cruza a nossa vida, desencadeando uma sequência de acontecimentos cujo resultado nunca poderíamos ter previsto.

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